terça-feira, 26 de março de 2013

Eu, ela e a Hannah Montana

Aí a menina ficou triste porque brigou com o namoradinho que descobriu seu segredo. Ela se refugiou num velho gazebo com roupas puídas e um violão e, no caderno, escreveu a letra de uma música. Tocou para o pai, que foi buscá-la no canto escondido, e dividiu com ele a mágoa na base do dueto bem afinado. Não é história de verdade, é uma parte do filme "Hannah Montana - O Melhor de Dois Mundos". Dezoito meses atrás, a Sabrina viu esse filme - e uma coisa tocou dentro dela. Moda de viola.

Algumas das amiguinhas da Sasá assistem novela, como Carrossel (no SBT) e Violetta (no Disney Channel). Eu vetei ambas em casa porque a primeira é bem porcaria e termina tarde e a segunda é bem porcaria e... é muito porcaria. Eu considero porcaria aquilo que eu não assinaria como escritora: o texto é chinfrim, os clichês correm soltos, o enredo é manjado e um bocado babaca. Nem são engraçadas. Porque a gente até aceita assistir uma porcaria, mas que seja pelo menos uma porcaria engraçada, poxa!

Novelas para a idade dela não são. Mas os seriados são. Aqueles que chamam de "enlatados americanos" - que nós, adultos, conhecemos tão bem do Sony ou da Warner e os pequenos conhecem dos canais infanto-juvenis. Quer dizer, nem todos conhecem: recentemente a Sabrina veio me contar que uma das amigas fica chateada que os pais não a deixam assistir seriados na TV a cabo. Não sei o motivo exato, mas suspeito do velho combo "é uma droga globalizada". São mesmo. Mas são engraçados e os diálogos e enredos costumam ser bem acertadinhos. Eu rio. Sabrina também.

Aí a gente chega na Hannah Montana. Enquanto série, a personagem nunca chegou aqui em casa. Acho que quando o seriado estrelado pela cantriz adolescente Miley Cyrus passava na TV, Sasá era pequena e ainda curtia mais um Backyardigans do que "filmes de gente viva", como ela chama (o que não é desenho). Passou batida toda febre de Hannah Montana. Anos mais tarde, já pelos 6 anos e meio, ela se engraçou com outras séries do tipo, como "Zack & Cody", "Jessie" e "iCarly". Vinha assistindo uns aqui e ali até que, um dia, o canal passou a propaganda de um "filme de gente viva" que estrearia logo. Ela pediu pra ver, eu deixei.

Sentei pra ver junto vários pedaços e entendi que era um longa da Hannah Montana, com a personagem pirando na fama e sendo levada de volta às raízes no meio rural nos Estados Unidos. Era engraçadinho. Na cena descrita lá no primeiro parágrafo, eu vi Sabrina de olhos estalados na tela. Es-ta-la-dos. O queixo estava até meio penso na cara. Ficou embasbacada com a menina e o violão.

Sasá já tinha, naquele mesmo mês, ficado animada com "Escola de Rock", visto no DVD. Mas a batida rock'n'roll estava muito avançada, acho; o country melódico fez melhor o trabalho de enaltecer os instrumentos e a canção em si. O rock plantou, a Hannah Montana colheu.

No Natal, a criança esqueceu qualquer boneca, jogo e outros e escreveu um calhamaço de cartas pro Noel trazer, porfavorzinho!, um violão de presente. Noel camelou pelas ruas, mas achou e trouxe o violão. No início das aulas, lá foi Sabrina driblar esportes e artes e se inscrever, decididamente, na aula de musicalização. Ela entendeu que pai e mãe não ajudariam nada nessa hora - porque eu, por exemplo, sou ruim até de tocar triângulo. Se o mundo musical dela dependesse dos parentes, ia a lugar nenhum. As aulas ensinaram muito. E aconteceu uma paixonite pelo violino, um flerte com o piano... e um amor descarado pelo violão.

Esse ano Sabrina correu ainda mais adiante e se colocou na aula de violão mesmo, nada mais de chocalhos, reco-recos e apitos no caminho. Só ela, o violão e a determinação. (E um apoio de pé, um apoio de partitura, pasta pras canções, "deixa minha unha do dedão sem cortar pra poder tocar melhor, vai, mãe?). Não, unha comprida só lá quando eu não for mais a responsável pela integridade dela.

No mais, fiz de tudo o que podia pra esse sonho de se expressar com o violão virasse uma realidade. Mas eu sei que eu fiz muito pouco. Ela fez tudo. A Hannah Montana fez mais ainda. Bobamente, com aquele roteiro engraçadinho e muito carisma, Hannah Montana despertou uma criança para a música. E, só por isso, ela já vai estar sempre no meu coração.



Hannah Montana começou, agora todo tempo é uma Ode à Alegria


quarta-feira, 13 de março de 2013

Uma nova revista para elle, ops, ela

Aí chegou a década de 1990 e todo mundo que tinha desconfiado ganhou certeza: o cigarro era coisa ruim mesmo. Rolou processo, protesto, piti - e um monte de filmes pra falar que a indústria do tabaco era feia e boba e mentiu dizendo que pitar um fumo era sucesso, quando na verdade era tiro na testa. Passados todos esses anos, até Hollywood (a do cinema, não a do "sucesso") desencanou de produções contando os bastidores do que todo mundo já sabia. Cigarro, a longo prazo, causava doença, morte e um futum lazarento na pessoa. Cigarro fazer mal é notícia velha. Então a gente já pode colocar na mesma seara as revistas femininas e essa coisa de "oh, elas estabelecem uma ditadura de beleza inalcançável e condena todas nós a morrer pobres, deprimidas, barangas e humilhadas!"? Chega, passou. Revista feminina te faz mal? Para de consumir, oras

O caso é que as revistas femininas de fato acabaram se enrolando em todo o processo de aquisição do "girl power" e, com os anos, o que era um periódico pra falar dos vestidos rodados da moda e de como arrumar bem a casa pro marido virou um emaranhado de informações loucas e/ou dispensáveis. Porque quantas matérias sobre biquínis, dietas e scarpins a gente consegue ler na vida? A maioria já deve ter tido sua cota.

As revistas femininas no Brasil, hoje, se limitam a meia dúzia de títulos que versam muito sobre roupa, sapato, maquiagem, cabelão e celebridades. Fazer o quê? Talvez as pesquisas digam que a mulher brasileira quer ler isso aí, ué. Eu, de minha parte, acho que pesquisa é o cacete e bom seria parar de ir sempre na mesma onda e criar a tendência, mostrar para a leitora uma coisa nova, descobrir e oferecer um caminho, e não servir só o arroz com feijão de anteontem. Isso dá azia. E gases. Ó, vai ver é por isso que as moças saem com aquela cara na foto da capa!

Eu sei, parece mesmo uma ditadura de gente fazendo carão (carão de quem não sabe multiplicar número de dois dígitos), vestindo roupas que só ficam bem em coxas que não se roçam, usando sapatos que causam joanete, sugerindo cardápios de água, torrada e peito de peru do café ao jantar e apostando que cremes anti-idade são máquina do tempo.

Mas não é uma ditadura que te aponta revólver, joga no bagageiro e leva pro porão escuso, tá? O jornaleiro não vai te perseguir pelas ruas se você disser "não, Juarez, obrigada mas hoje eu prefiro não levar a Fulana porque essa atriz da capa me assusta com tanto aplique e brocado e eu não gostei dessa chamada sobre '879 maneiras de trancar seu homem num cativeiro até ele te amar de verdade'". Juarez não liga. Você devia ligar menos também.

É só entretenimento, gente. Só isso. Digo com certeza, por conhecimento, que a revista não é uma entidade inteligente programada para desgraçar mulheres. A revista é um objeto inanimado feito por moças comuns, como eu e você, que comem, bebem, dormem, dormem com vários caras até achar o certo, dormem na reunião de pauta chata, viajam, vão ao cinema, têm filhos, problemas e contas a pagar. Elas são, na maioria, normais e bacanas - ao contrário do que Anna Wintour e "O Diabo Veste Prada" andaram propagando por aí.

Elas fazem o melhor que podem com a abertura que têm. O problema, se é que existe algum, talvez seja esse mesmo: no afã de encantar só a diretoria com centenas de páginas cintilantes, as revistas esqueceram de encantar as moças que trabalham ali mesmo. E eu. E você, garota comum. Gente que apenas acorda... gente. Que não é mulherzinha o tempo in-tei-ri-nho - e talvez gostasse de ler mais sobre lugares interessantes, sobre móveis ecológicos, sobre uma noite no karaokê e até sobre como dar um up no guarda-roupa sem gastar um carro zero. Reportagens legais pra pessoas de verdade que, sim, são mulheres e gostam de uma linguagem focada em si, com a sua pegada feminina, um pouco feminista, bastante maricota às vezes mas não sempre.

E, eu sei, dá raiva quando dizem que "mas então, temos sim este mês uma entrevista com a Isabel Allende e uma reportagem sobre o tráfico de crianças no Malawi!". Sim, e duas páginas depois tem uma moça com a silhueta característica do Malawi desfilando casacos com o valor do PIB do Malawi. Botar uma entrevista-cabeção em revista feminina, hoje, é como botar uma página de texto corrido na Playboy - é sistema de cotas apenas. Não é sério.

É isso, não é sério. Não leve a sério. E, se perceber que tá levando a sério, larga a coisa! Ninguém é obrigado a se basear em publicações. Se o lanche comprado no McDonald's não parece com o da foto, porque a gente precisa parecer?!

Pede ao Juarez da banca uma revista de viagem. De culinária. De esporte (mas só se amar futebol, que outra coisa quase não tem). Aposta em uma edição sobre patchwork, quem sabe você não se descobre um gênio da costura? Compra um caderno de violão. Compra um gibi! Eu recomendo os da Disney, estão em ótima fase. Ou compra mesmo a revista feminina, ignora o que parecer balela e segura o que é bom. Nem que seja a amostra grátis de perfume.

Na era da tecnologia, assina no tablet uma edição estrangeira - aproveita pra treinar um idioma e testar revistas nicho de mercado, que no exterior tem muita. Muita. Dá pra assinar revista só sobre primatas. Albinos. Do ocidente. Pode apostar.

O que não dá mais é pra se diminuir perante uma garota de 17 anos com o quadril de um melão e a pele de juventude e achar que o mundo vai te cobrar ser assim também. O mundo tá nem aí. Aliás, ele saiu há horas pra fumar um cigarro e não voltou.


Fica fria, não é o general da ditadura, é só... uma moça com muita dor de cabeça?