quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Tumdum, tumdum

Eu só precisava que alguém escutasse o meu coração. Escutasse mesmo, pra valer, prestando atenção em mim e nos detalhes. Ouvisse com calma e cuidado e sem pressa, que não pode escutar um coração com pressa. E pode esquecer a filosofia, eu queria realmente que alguém escutasse o meu coração - assim, com estetoscópio mesmo.

Mas achar um(a) doutor(a) que fizesse isso parecia impossível como encontrar panetone sem caixa amassada no Pão de Açúcar. Ninguém queria. Ninguém queria botar a coisinha grudada no peito e escutar, ninguém queria medir sequer a pressão arterial. Percebi que, hoje, isso compromete: se a pessoa estiver tendo um ataque, quem escutou e mediu precisa socorrer. E deus nos livre de ter que socorrer um atacado, né? Amém!

Ninguém queria escutar e, aquele que foi obrigado, fez marromêno. E me mandou acalmar. Ora, se isso fosse possível eu não precisaria me abalar até o local de atendimento de enfermos e pagar 20 paus de estacionamento, eu só me acalmava e pronto. Mas não era tão fácil. E não era nada grave também, parece. Mas ninguém podia escutar?

Aí uma boa alma me indicou um bom profissional. E eu fiquei pas-ma. Doutor José me atendeu, ouviu e falou muito pouco. Bem pouco mesmo - o que deixa uma verborrágica incorrigível como eu muito incomodada. Eu queria médico que falasse um monte, horas, num bate-papo-clínico de sonho (sonho hipocondríaco, eu sei). Bom, ele falava pouco, mas agia.

Doutor José, pas-mem, me mandou subir numa maca toda profissa e com papel arrumadinho por cima. ME OLHOU NOS OLHOS! Quase apaixonei, porque acho que nenhum médico me olha nos olhos desde a Clínica Modelo, em São Bernardo do Campo, nos idos de 1978, quando eu ganhava pirulito no final.

Olhou nos olhos, baixou a região da olheira com cuidado, mandou olhar pra cima. Acho que um médico não faz isso desde 1978 mesmo - não só comigo, com todos no planeta todo. Tomou pulso no pulso. Mediu a pressão! Ó, e nem foi preso por isso.

Então ele mandou deitar na maca. Deve fazer tanto tempo que um médico não faz exame assim de paciente que poderia até ser considerado assédio. Mas não era, era sapiência. Ele apertou a barriga, ele apertou o pescoço, ele apertou até minhas canelas. Ele escutou o peito com a coisinha de escutar. Me senti com três anos de novo. E contente.

Doutor José pediu uma bateria de exames os mais bestas e padrão, só pra saber como eu vou no geral. Já avisou que estresse is a bitch (não com essas palavras) e muito do que eu sinto parece muito vir daí. Mas ele quer checar tudo direitinho e, resultados em mãos, me mostrar a luz no fim do túnel - a boa, não aquela que nos leva pro campo de golfe nas estrelas.

O consultório dele é daqueles que tem escrito na plaquinha 'Doutor José XXXX', clínico geral. Eu gosto de clínicos gerais. Eles são como pão com manteiga - é simples, é corriqueiro, mas sana todos os aspectos da fome e fica na nossa memória e coração (poética e fisiologicamente).

Doutor José, se falasse só um tico mais e fizesse umas piadas sobre verminose, seria eleito meu guru para sempre. Eu ainda preciso ver se ele vai se adequar - porque eu sou iludida quanto à prática médica, como explicado aqui. Mas tem grande chance. Ele ouviu meu coração, isso é sinal e tanto.