Amanhã já vou descer a mala do armário alto, separar a mochila e começar a rechear ambas com meus trapinhos. O seguro já está impresso, assim como o e-ticket, e o passaporte foi tirado da capa e sacudido até a poeira sair toda. Mas, mesmo com todas as preliminares, acho que só vou acreditar quando desembarcar. Eu, você, Nova York!? Essa história não vai acabar bem... Pois ela já começou demais.
Te contei, né? Dono da Casa combinou almoço comigo e chegou atrasado, aquele pulha, sabendo muito bem o que eu penso de gente que atrasa. Bom, chegou atrasado e com uma sacola da livraria. Eu segurei o discurso e perguntei só por que, diabos, ele tinha atrasado pra passar na livraria. Disse que era um presente pra mim. É um encantador de serpentes mesmo, sempre sabe o que dizer. Bom, eu estranhei ganhar um livro sem motivo e, mais ainda, quando abri e vi que era um guia de Nova York. O meu estava velho e atrasado mesmo - WTC ainda na página 42, vê se pode... - mas me dar um guia? Eu estranhei, ele mandou abrir a contracapa. E ali, singelamente escrito a lápis num post-it, o número do vôo que ele reservou em meu nome usando as tão suadas milhas.
Preciso dizer que eu chorei que nem bebê com fome e assustei até o garçom, que achou que eu me desesperei pelo couvert? Pois sim. Esse homem me mata dando esse presente de sonho. E foi pacote completo, né? Já tinha falado com a minha mãe pra vir ajudar com as meninas, já tinha falado contigo pra ir me encontrar na Grande Maçã... Dissimulada, ficou de mexerico com meu marido pelas minhas costas!
Bom, daí foi passar um mês desejando que o relógio rodasse mais rápido e repassando mentalmente como será nossa visita ao Museu de História Natural pra ver a exposição dos animais bioluminescentes, como será nosso hot-dog de carrocinha em plena escadaria da Biblioteca, como vamos saltitar pelas vielas do Central Park, como vamos nos perder tentando achar lojinhas, como vamos almoçar lindamente no Prune... Te falei do Prune, né? Da chef que escreveu "Sangue, Ossos & Manteiga", que eu acabo de ler e é um must-read pra quem curte uma cozinha e uma saga de família.
Também teci sonhos sobre finalmente ir ao Brooklyn, naquele restaurante que dá de fundos com a Ponte, coisa de cinema. Dizem que lá eles fazem sobremesas supervalorizadas que valem cada mordida. Se for o caso, a gente testa - e, se não for, a gente apenas vai na Grimaldi's comer pizza em pé, encarando a fila na porta e tudo. Forno de tijolo a lenha, minha amiga, forno de tijolo a lenha. Americanos param nele. Nós também.
Isso tudo pra não te contar que, sim, a senhora vai camelar comigo High Line afora. Sabe, aquele parque feito por sobre um antigo "minhocão", os trilhos desativados de trem. Pois é: deve dar uma hora de caminhada, mas felizmente nosso preparo físico é ótimo (ainda que não). A gente para de vez em quando nos recuos pra descansar e olhar a vista de 4 metros de altura, tá?
São tantas as possibilidades, tão poucos dias... Mas eu sei que a gente aproveita. A gente aproveitou até aquela viagem até Araraquara pra fazer palestra pra seis pessoas, não foi? Então. Pode inventar aí suas barbaridades também, vamos botar tudo na lista. E sair da lista também e deixar o clima e o vento nos carregarem pela cidade grande. Ela não oprime, isso foi coisa que inventaram. Nova York é uma delícia, uma farra, um lugar pra quem quer ver de tudo ao mesmo tempo. Eu gosto, sempre me encontrei lá. Essa mania de uma turma aí dizer que é amecanizar demais gostar de Nova York ou que é ridículo achar que se pode curtir uma megalópole ou que é um lugar sujo, violento, feio, "besteira viajar pra fora com tantas coisa linda no Brasil"... nossa, coisa mais antiga. Até porque, eu não viajo pra fora, eu sempre viajo pra dentro. Pra dentro de mim.
E eu sei que você também. E é por isso que a gente vai curtir tanto. Ai, vai ser tanta coisa pra conversar e rir e sentir que eu acho que vamos precisar de um cirurgião plástico pra tirar o sorriso das nossas caras! Te espero no portão de desembarque 7h30 ou coisa assim, conforme combinado, hein? Levarei bolacha Passatempo de presente.
Com amor,
Flá
PS.: New York, New York, com todo respeito aos clássicos, é coisa do passado.