quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Enlouqueça a Mamãe - Módulo 1

A verdade é que as mães são gente bem fácil de enlouquecer. Devem existir umas exceções, mas a maioria tem o espírito naturalmente atacado - que fica logo inflamado ou realmente possuído pelo demo com um mero sapato perdido na sala ou um banheiro extra-molhado.

Toda essa amolação costuma acontecer sem querer, a gente sabe. Bastou esquecer um telefonema para avisar onde foi, derramar um pingo de leite no chão da cozinha ou tecer uma crítica à maciez da carne, pronto: instala-se a loucura materna.

Mas se isso não é só um acaso pra você e sua intenção é de fato enlouquecer uma mãe, é só apertar intencionalmente certos botões. Ao longo do tempo, posso ensinar quais deles. Hoje, o primeiro.

* * *


Se tem uma coisa que mãe "ama de paixão" é saber que alguém dá conta de seu pivete melhor do que ela. Sendo assim, pra começar a transtornar a genitora, saque daquela velha mania de cuidar da criança por apenas algumas míseras horas e depois, ao devolver, diga coisas legais como "ai, ele se comportou superbem! Imagina que ele é agitado... Você é que é nervosa demais".

Também vale apelar para o "mas aqui ele comeu de tudo, até couve-de-bruxelas!" ou "ela é um doce de menina, colocou a mesa, arrumou as camas, limpou a caixa d'água... Jura que na sua casa ela não ajuda nada?".

Enlouquecer uma mãe é mesmo muito fácil, basta saber como.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

De onde a gente vem

Nossa Senhora dos Parentes está de prova: Sabrina anda numa incrível e infindável fase "árvore genealógica". Não demora um minuto de conversa com qualquer pessoa para ela começar com "quem é a mãe da sua mãe?". E, se vem a resposta nominal, ela já aproveita e pergunta logo do pai do pai do seu pai, dos tios, dos primos...

Ontem e hoje, com a visita da Vovó Conceição aqui em casa, essas sessões de regressão familiar pululam! Hoje já tivemos um inestimável papo sobre os pais da Vovó e os pais destes. Sasá ficou ciente de que o biso se chamava Álvaro e era um português lindo de morrer. E que a bisa era italianona. E que o tio Álvaro Filho já morreu, mas que a tia Antonieta mora ainda hoje em Jundiaí (e deus permita que a Sabrina não resolva fazer uma visita a ela só pra começar com outro "quem era a mãe da sua mãe?"... senão logo estaremos esbarrando no sangue de Machado de Assis, de Dom Pedro ou dos faraós).

A perguntação pelo menos rende frutos muito reveladores. Pra mim, por exemplo, está tudo se explicando. Já sei de onde vêm minha predileção por viagens (do vô que trabalhava na Fepasa), meus problemas oculares (da Vó Ondina), o excesso de peso (da italianona, por certo) e a contribuição do bisavô Álvaro. Não, não foi a boniteza. Foi o bigode português mesmo.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Chez Nous

Nós aqui desta família temos um grande desvio de caráter: a gente é chegadíssimo em restaurantes. E nem é pela facilidade da coisa em si; é mais pela quebra de rotina de ir comer algo que não sabemos/não temos habilidade de produzir.

Daí que às vezes vamos comer fora duas vezes num mesmo fim de semana. Nos dias de semana de férias, arriscamos o mesmo desvio de conduta - e quando convencemos os amigos a participar, vira até passeio. Mas, felizmente, muitas vezes conseguimos voltar à realidade dos fatos e ver que a comida feita aqui em casa é tão deliciosa quando. Quer dizer, quando tudo sai direito e quando a companhia é boa.

Pois hoje nós duas, as meninas em férias, decidimos fazer trabalho de equipe e brincar de restaurante e trabalhar um pouco em causa própria. Fizemos arroz fresquinho com ervas e feijão fresquinho com bastante caldo. Fizemos carne no forno com molho de maracujá e fizemos também batatinhas fritas, que não somos de ferro. A salada foi servida antes, como manda o figurino, e como a Sasá não bebe vinho, optamos por um suco de laranja gelado mesmo.

Colocamos a mesa, rimos a valer, enchemos as panças, foi uma delícia. As lichias de sobremesa e o café foram servidos em louça bonita e no "living", que a gente sabe ser fresca. O melhor de tudo, porém, não foi esse cardápio safadíssimo: foi a companhia boa e o serviço de primeira (que, no caso, foram papéis encarnados por nós duas mesmo).

E assim se fez o melhor restaurante do mundo. Baratinho, criativo e glamuroso como nossa vida pode e deve ser.



Para o jantar, logo mais, decidimos por fetuccine ao molho de espinafre. A gente está ficando realmente besta, viu... Cadê nossas estrelas do Michelin, hein?

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

A mulher de branco

Se eu fosse espírita, já estaria acreditando que hoje em dia toda família é seguida por almas penadas zelosas que partilham o pão e cuidam dos seres humanos. Como eu não sou espírita, sei que aquelas moças vestidas de branco dos pés à cabeça não estão vagando a esmo em torno dos clãs familiares. Elas estão é bem vivas, cuidando das crianças não do além, mas além da conta. Muito além da conta.

Atualmente parece que ter babá é tão comum e vital quanto ter carro e geladeira. Nem bem a moça de classe média alta engravida, já corre pedir indicações de uma mocinha pra chamar de sua (e vestir de branco). Tudo bem, é verdade que a maioria das mulheres hoje trabalha - e muito - e nem todas querem colocar os bebês na escolinha já aos 5 meses. Elas preferem, assim, contratar ajuda. E a ajuda regular é compreensível. Mas e a ajuda ostensiva?

Pra mim é absurdamente comum sair no fim de semana pra almoçar fora e notar a configuração "pai, mãe, criança, babá" nas mesas vizinhas. Vejam: babá em dia de semana, cuidando para que a criança esteja alimentada, limpinha, cuidada e entretida, natural; babá que precisa estar presente sábado e domingo, dentro e fora de casa, em todas as horas, é bizarro.

Muita gente parece ter terceirizado o trabalho de ser pai e mãe. Não querem (não sabem?) cuidar dos filhos por conta própria. Alguns parecem inclusive ter paúra da própria prole - enquanto a mulher de branco, por outro lado, parece dominar a situação facinho. As pessoas têm os filhos, mas talvez achem um saco estar presente sempre, liderando como um bom guia prático, intelectual e psicológico. Deixam isso pra moça contratada. E vestida de branco, o que parece um traço herdado dos tempos de casa grande/senzala, uma necessidade de diferenciar papéis. "Ela cuida do moleque, mas a mãe sou eu, sociedade! É só notar a roupa branca dela, ok?".

Se isso já me incomoda normalmente, nas férias passou da conta. O casal surgiu circulando pelo hotel, seguido de perto por duas crianças bonitinhas. Ao lado das crianças bonitinhas, a babá. Pô, convocaram a pobre até nas férias? Exagero, hein? Era só fazer a conta: dois adultos, duas crianças, um cuida de cada e tá fechado. Mas não. Mais tarde, vi que também estava presentes avô e avó - já estamos em cinco adultos para só duas crianças, confere? Nem se fossem um Mussolini Jr. e uma Pequena Richthofen seria preciso tamanho séquito, eu acho. Mas a babá estava lá.

Além da situação idiota de a moça cuidar dos pequenos todo o tempo, do raiar do sol ao poente, em todas as refeições, brincadeiras e crises de choro e mimo, o detalhe chocante: a moça só entrava na piscina de maiô, short e camiseta. Short e camiseta. No calor de 35 graus. Sinhazinha, por certo, não achava correto a empregada circular somente com roupa de banho por aí.

Sei que não é da minha conta. Sei mesmo. Mas, ainda assim, não consigo deixar de me ressentir tanto pelos filhos, órfãos de pais vivos, quanto pelos pais. Queria saber se eles conhecem mesmo aquelas crianças, sabem seus livros prediletos, seus jogos favoritos, o que pensam dos colegas, de si mesmos, o que gostam de comer no café da manhã. Penso se têm noção do que estão perdendo entregando até mesmo o mais corriqueiro "operacional" para a moça de branco fazer. Não podem ser pais tempo integral nem aos sábados? Nem por uma hora de refeição? Nem nas férias? Ter filhos pra colocar no porta-retratos me parece uma grande perda, e pra vocês?

Não sendo espírita, eu acredito que a vida é uma só e deve ser muito bem aproveitada junto aos pequeninos - e que a mulher de branco não precisa ser essa entidade constante.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

O respeito já morreu

Sabrina não é mais aquele bebê inocente. Já sabe muito bem desancar seus pais e colocá-los naquela pose de queixo caído e indecisão entre rir muito ou se emputecer.

Sócia da Light na cozinha, colocando uns pares de legumes no liquidificador e malhando as lâminas pra tudo ficar moído:

- Mãe! Mãããe!!! Pode desligar isso, que eu estou vendo um filme e esse barulho é miserável...?
(Toda uma pronúncia de professora de português incluída.)

* * *


Dono da Casa organizando suas coisas espalhadas e Sabrina orbitando:

- Pai, esse seu relógio é lindo.
- Obrigado, Sá. Agora põe o relógio de volta na mesa que eu acabei de comprar. E nem paguei tudo.
- Então... você é bandido, pai.

O respeito, se já não morreu, está bem moribundo.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Vida simples

Sempre gostei de muitas coisas sobre a minha família (entre elas a habilidade pra fazer molho de macarrão e o gosto por tiração de sarro). Mas talvez a coisa que eu mais goste sobre a minha família, desde sempre e ainda hoje, seja o jeito simples.

Falo de "jeito simples" não no sentido de sermos simplórios. Muito pelo contrário. Minha mãe, por exemplo, tem uma cabeça privilegiada que não para nunca (juro, nunca!, a mulher é um gerador de energia e ideias). Meu irmão é daqueles gênios sócio-profissionais, capaz de tocar qualquer instrumento de ouvido e ainda bater a meta do trabalho em setembro.

Minha irmã é um rolo compressor multi-tarefas, meu pai começou a trabalhar aos oito anos e soube fazer a vida como poucos, meus cunhados são estrelas em suas áreas; até as crianças já estão colocando seu brilho pra fora - sem falar no Dono da Casa, que conseguiu ser um jornalista bem-sucedido, coisa mais difícil de encontrar do que festa de empresa sem gerente bêbado com gravata amarrada na testa.

Mas eu posso dizer: mesmo com todas essas características de gente inteligente, criativa e bem lançada, minha família é simples. Ninguém "enfofa", sacomé? Ninguém complica a parada com brigas, com esquemas, com fofoquinha, com problemas imaginários. Ninguém se enfia em confusões que não possa resolver, ninguém faz besteira que custe caro depois. Falamos na cara, mas com gentileza; somos responsáveis, mas matamos uma garrafa de vinho por refeição; sabemos dar valor pro que importa (pela ordem, o que é certo, as pessoas e os pacotes de viagem).

Eu adoro fazer parte dessa família por muitos motivos, mas esse é dos maiores: gosto da simplicidade deles todos, de como levam suas vidas, aproveitam o caminho e usam o senso. Tem coisa mais simples?

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Minhas férias

Não há compromisso com nada. Não tem hora certa de comer ou dormir, o computador só é ligado por diversão, dá pra ficar de pijama até tarde ou vestir chinelos pra sair em público. As férias são mesmo um tempo estranho.

Os dias que tiramos na praia, por exemplo. Coisa mais esquisita... Ninguém se queixando, ninguém bufando, ninguém se impacientando. Ninguém planejando cada mísera meia hora do dia, ninguém botando a criança nos eixos, ninguém acoplado ao celular como se fosse uma extensão da orelha. E ninguém notando nada disso!

Nós comemos coisas estranhas também - uns peixes improváveis, umas panquecas feitas de farinha e umas frutas que não sabíamos soletrar o nome. Nós tiramos o branco-palmito da pele, nós usamos roupa de banho até às 20h, nós esfoliamos o calcanhar sem pagar pedicure. Nossos cabelos não foram penteados e viraram uma massaroca a la gente das cavernas; nossas maiores preocupações diziam respeito a qual sabor de picolé escolher. Coisa. Mais. Estranha.

A gente mal reparou no mundo ao redor. Esquecemos de trancar as portas do quarto de hotel, ignoramos o preço do coco verde (e tomamos uns 387 deles), demos de ombros pro fato de uma sub-celebridade estar hospedada ali ao lado. Esquecemos até de odiar forró - e cantarolamos um pouco de "você não vale nada mas eu gosto de você" na festa da virada!

O que eu acho mais bacana nas férias, no entanto, não é toda essa malemolência esquisitona que se apossa do nosso corpo tenso de cidade. É a existência de todo um tempo extra pra pensar na vida - refazer planos, repensar ideias, inventar objetivos malucos, sonhar com dias vindouros.

Pensando bem, estranho mesmo é não fazer isso todo dia do ano, só nas férias. Quando chegam as próximas, hein? Não vejo a hora de vestir o maiô e poder pensar na vida.